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domingo, 27 de janeiro de 2013

Porque o tamanho não importa






Tenham calma, isto ainda não virou um blog pornográfico nem vamos fazer nenhum tipo de punchline com o nosso título. Venho-vos falar de futebol. Quer dizer, do futebol e de outras coisas com ele relacionadas, mas no fundo é futebol.

Hoje senti-me inspirado pela prestação de Cabo-Verde na CAN. Tenho imensos amigos que são desse país e mais uma parte remota da minha família que também vem de lá e por isso estou bem identificado com a terra. Fruto desse conhecimento, tenho noção que a selecção portuguesa é vivida com fervor naquela nação como se da sua selecção nacional se tratasse. Talvez isto seja porque a selecção de Cabo-Verde não está habituada a altas andanças neste mundo da bola e porque o seu campeonato nacional é ainda amador. O futebol profissional que se respira no pequeno arquipélago é o português. Mas se metermos o profissionalismo de parte, a realidade é outra ...

Basta saírem para uma rua qualquer de uma cidade qualquer de uma ilha qualquer para encontrarem miúdos a jogar futebol. Sem campos, muitas vezes sem sapatos e com uma baliza feita de duas pedras, a terra batida ou a areia é o palco dos sonhos de muitos miúdos que sonham vir a vestir a camisola do Barcelona, do Manchester United ou até do Benfica ou do Porto. Sonham ser o próximo Ronaldo, o próximo Figo e muitos sonham mesmo vir para Portugal e vestir a camisola das quinas nos campeonatos internacionais.

Falo por experiência própria. No balneário da minha equipa fala-se tanto crioulo como português, mas seja qual for a língua ou o dialecto percebe-se que as ambições de dezenas de miúdos talentosos oriundos desse belo país abençoado na sua paisagem excedem, em grande escala, as dimensões geográficas do mesmo. Conheço casos de jogadores que eram internacionais sub-20 no seu país de nascimento mas que, chegados a Portugal, vêem imensas portas a serem fechadas. Vinham à procura de melhores condições, mas não encontram sequer oportunidades.

Mudam de um cenário em que estão incapacitados financeiramente de crescer para um cenário em que desportivamente são olhados com desconfiança. Deixam estágios onde ter hotel ou almoço pago é visto como um luxo para viverem a sua vida futebolística de captação em captação, ouvindo em cada uma delas uma desculpa nova para "és estrangeiro e tenho medo de investir em ti e então vou-te mandar embora".

Aqueles que conseguem mesmo ultrapassar todas as dificuldades e conseguem singrar no futebol acabam por deixar para trás a nação que os viu nascer e deixam-se aliciar pelos privilégios e regalias de jogar por um país de maior projecção internacional. Cabo-Verde é, então, uma nação exportadora de talentos, rica em matéria prima futebolística, recheada de atletas de carácter forte e com uma determinação que só quem lida com eles pode descrever. Mas algo mudou ...

Eis que essa pequena nação, contra todas as adversidades, com muito pouco dinheiro e apenas com fé e esperança no coração conseguiu trabalhar uma nova geração de jogadores e construir uma equipa competitiva, organizada e com o espírito solidário que é característico do povo crioulo. O povo afável e hospitaleiro viu-se representado na CAN por um grupo de guerreiros que não virou a cara à luta a nações muito mais poderosas e financeiramente muito mais prósperas.

Agora aqueles pequenos que jogam à bola com os seus pés descalços pelas ruas do país já têm novos ídolos, já têm novos orgulhos. Já não precisam de ambicionar ser Ronaldo ou Messi, já podem querer ser como Ryan Mendes ou Babanco. Já não precisam de sonhar com a camisola das quinas, já podem sonhar em vestir as suas cores, o azul e o vermelho, em competições internacionais. Aqueles que chegam a outros países já não serão olhados com desconfiança e já poderão ser reconhecidos pelo seu mérito, a sua nacionalidade já poderá ser sinónimo de qualidade. Isto tudo porque esta geração de jogadores abriu novas portas para estes miúdos, criaram novas oportunidades para todos os cabo-verdianos que tenham um sonho no futebol. Isto tudo porque o pequeno país de Cabo-Verde se tornou grande o suficiente para deixar a sua marca no futebol.

Os meus mais sinceros parabéns a toda essa nação e a todos os atletas que a representam. São verdadeiramente inspiradores !

2 comentário(s):

Jotas disse...

Belo artigo, mostrando (quase) na 1ª pessoa o orgulho dos feitos do pequeno arquipélago de Cabo Verde. Parabéns a todos os cabo-verdianos!

27 de janeiro de 2013 às 20:19
Joe Casanova disse...

é além de tudo a prova que ainda há espaço para o romantismo no futebol!
felizmente não conta somente o dinheiro dos sheiks e do petróleo!
Artigo muito oportuno

27 de janeiro de 2013 às 21:34

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